Compaixão e dó

Conhecer “o gosto da lágrima das pessoas”. O que é uma bem-vinda contramão do fluxo comum já que o que se espera de um aplicador da lei é que ele exerça sua prerrogativa com justiça e imparcialidade ao mesmo tempo que o símbolo da justiça no Brasil é uma mulher com os olhos vendados.   Compreender seu papel num mundo relativizado, conhecendo seu próprio poder e discernindo todas as partes envolvidas oferece ao magistrado uma condição ímpar para proferir seu julgamento.

Por isso muitas vezes é inconcebível compreender a compaixão. Ela é silenciosa, mas também é grito. Ela é pura, mas também é palavrão. Sim, pois ter compaixão é olhar o outro e saber sua real necessidade naquele momento: uma bronca, um carinho, um toque, um tapa, uma orientação… Desde que uma condição especial seja satisfeita: que toda a ação compassiva seja movida pelo coração.

O coração partido é aquele que se abre para conhecer a compaixão!

Compaixão só se tem quando se está por inteiro!

Nesse contexto, podemos identificar cinco maneiras de exercitar a compaixão:

– Olhar quem sofre e acolhê-lo com ternura. O que fazer para ajudá-lo a desabrochar suas qualidades?

– Despertar a força interior da pessoa. Isso pode ser tanto para o bem como para o mal. Podemos extrair pena ou confiança da pessoa. O que determina isso é posso estimular a alegria dela ou utilizar sua raiva na constituição de algo bom para a vida.

– Doar bens e oferecer condições. O mesmo que dá o peixe que alimenta e a vara para pescar o próximo. Generosidade e riqueza!

– Saber dizer a pessoa: Chega! Basta! Inclusivo com gritos, se necessário.

– Oferecer nossa própria natureza essencial que dá sentido às outras.

O sofrimento do outro pode ser a base, o combustível da compaixão. Esse é o despertar da compaixão, é como esfregar o vidro embaçado da janela e deixar entrar a luz da consciência. Se eu sinto, o outro sente.

Do contrário, quando se bloqueia a compaixão, só resta o dó, a pena. A pessoa se sente sozinha, apequenada, com medo, vitimizada. Parece que o outro possui uma luz divina, o outro não sofre, somente ela.

A compaixão é o desejo de que o outro saia da situação. O dó revela no outro minha própria identificação, o que valida a permanência do outro no mesmo estado. Pena (dó) é algo humilhante e ofensivo. É de cima para baixo, como se o outro fosse incapaz de reagir, de mudar a situação. Quando há pena numa relação, isso é comparável a um estado de autocomiseração, quando dois miseráveis disputam quem é o pior, contando migalhas de atenção e doença um do outro. O melhor caminho é o da compaixão, que nivela um com o outro e os permitem caminhar lado a lado.

Para que tudo isso seja possível, ficam três questionamentos essenciais para a reflexão e autoanálise:

– Será que só damos atenção ao outro quando estamos para perdê-los?

– Será que estamos ajudando o outro quando fazemos tudo por ele?

– Será que só somos compassivos quando estamos diante de tragédias?

Essas respostas somente você precisa saber.

Pense nisso.

Filipe Freitas

Inspirado em palestra ministrada pela psicanalista Elizabete Ruivo

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