Egocentrismo e devaneio entre os jovens
A adolescência é uma fase de instabilidade e questionamentos, da busca de si e da própria identidade. O jovem não é criança, nem adulto, e é nesse meio termo que sua inconstância o define, sendo esta um sinal de normalidade. Os padrões estabelecidos são questionados. As regras e o “status quo” são ponderados e até mesmo as escolhas de vida feitas pelos pais são criticadas. Ele está se posicionando na sociedade enquanto ainda descobre quem se é para si mesmo.
O pensamento do adolescente se diferencia do da criança na forma como pensa de si mesmo, sobre seus relacionamentos pessoais e sobre o mundo a sua volta. Enquanto a criança está relaxada e confiante de que é parte de um pequeno núcleo familiar, o jovem já se sente enquadrado num universo maior a nível de sociedade e potencialmente responsável para ser protagonista na formação de novos núcleos familiares. A criança se ocupa com o presente, com o aqui e agora, já o adolescente amplia seus conceitos incluindo o hipotético e o futuro.
Para os pais, esse também é um processo angustiante e confuso. Muitas famílias precisam forçadamente lidar com questões complexas como: o divórcio e consequente separação de um dos cônjuges dos filhos; a finitude e a incerteza de quando se dará o afastamento definitivo pela morte; das alterações de lugares provocadas por oportunidades de trabalho e as necessárias adaptações às novas realidades; o entendimento dos papéis na dinâmica familiar: além das possíveis frustrações dos pais por causa do crescimento e escolhas de seus filhos.
O adolescente constrói teorias e reflete sobre seu pensamento. Sua reflexão permite-lhe fugir do concreto na direção do abstrato possível. Ele exercita ideia no campo do possível e formula hipóteses definindo conceitos e valores. Ele permeia entre o real e o imaginário; e planeja o futuro e consegue se enxergar mais à frente.
Ao compreender seu próprio potencial e tomando consciência de que ele não somente será, mas, desde já, é responsável pelas suas escolhas e consequências, o adolescente começa a vivenciar papéis adultos, com um mundo de possibilidades futuras pessoalmente relevantes como: escolha profissional, escolha no cônjuge e etc.
Geralmente, o adolescente ingressa na sociedade adulta por meio de projetos, programas de vida, de planos de reformas políticas e sociais. Ou seja, o jovem se enxerga inicialmente como um ente reformador, capaz de mudar o mundo inteiro ao seu redor. No entanto, a verdadeira adaptação à maturidade só acontece quando o atributo reformador se transforma no realizador, quando o sujeito se move na direção da mudança de si mesmo.
Nesse momento, ele pode se transformar em uma pessoa egocêntrica, voltada aos seus próprios interesses. Procura pessoas que pensam como ele, que têm as mesmas ideias. Só assim poderá realizar tudo aquilo que imaginou e planejou. E se isso não ocorre, ele devaneia, se deixa levar pela fantasia, sonhar, delira.
Os sonhos podem proporcionar uma satisfação ilusória para algo que não se consegue realizar. O adolescente, na incerteza da vida, acaba criando seu próprio mundo interno e busca realizar nele todos os seus projetos. Nesse mundo, tudo dá certo, tudo se concretiza, tudo é sucesso. É uma satisfação substituta que omite a realidade. Uma dose profunda e constante disso pode desviá-lo da realidade e dificultará sua adaptação ao mundo externo e o convívio com seus problemas.
No entanto, na dose certa, uma fantasia pode ajudar a resolver seus conflitos e a prevenir a progressão da angústia. É nesse ensaio da ação, conforme afirmou Freud, que a imaginação pode dar ao jovem a confiança de que com responsabilidade e consciência, a vida pode ser possível de viver em realidade. Por isso vemos a importância da ludicidade típica da criança, que desde a tenra idade até meados da adolescência, possibilidade a ambiência propícia à criação de personagens e fantasias que servirão às vezes de modelos, outras de aios, e muitas vezes de inspiração tão necessária para quem ainda tem muito pela frente.
Pense nisso.
Filipe Freitas
Inspirado em palestra ministrada pela psicanalista Sonia Paschoalique