O estresse e o tempo

Imagem de Ryan McGuire por Pixabay

O termo estresse vem do termo em inglês “stress”. Essa palavra tem a ver como grau de deformação que algo pode sofrer normalmente causada por uma força externa. No entanto, esse termo cada vez mais tem sido usado pelo senso comum, o que vai tirando seu sentido científico. Na biologia, por exemplo, estresse define um conjunto de reações psicofisiológicas e comportamentais disparadas quando nos defrontamos com uma situação que exige um esforço do organismo para adaptar-se a ela.

Ou seja, quando uma situação de origem interna ou externa rompe com a inércia funcional, a homeostase, imediatamente algumas reações de diversas ordens são mobilizadas a fim de que a condição anterior ao rompimento se reestabeleça. A esse processo de restauração da homeostase é dado a denominação SAG, que significa Síndrome Geral de Adaptação.

Nos dias atuais, utilizamos o termo para qualquer mudança de vida que exija numerosos ajustes independente se a perspectiva for positiva, como um casamento, uma promoção ou uma viagem de férias, ou for negativa como uma demissão, um divórcio ou uma perda.

Para qualquer resposta que é exigida após um momento de estresse, duas possibilidades são normalmente encontradas: a fuga ou a luta. Sair ou ignorar a nova situação ou enfrenta-la ou resolvê-la. Além disso, foram levantados dois tipos básicos de estresse: o eustress, que é uma reação de adaptação que promove ganho de desempenho; e o distress, que a reação nociva do indivíduo, quando seu organismo não apresenta capacidade de enfrentar a situação de forma eficaz.

Um exemplo cinematográfico do estresse nos dias atuais pode ser visto no filme “Um Dia de Fúria”, onde um personagem perde o emprego e o rompimento da homeostase gera uma necessidade de restauração que não acontece facilmente. O sujeito insiste (e briga) em querer café da manhã em um restaurante que já está preparado para servir o almoço e em outro momento ele simplesmente saca uma arma por causa de uma discussão num campo de golfe.

Mas entre inúmeras possibilidades que poderíamos abordar acerca do estresse nos dias atuais, o tempo carrega em si uma característica especial. A inabilidade humana de lidar com o tempo e seus atributos leva o homem a se incompatibilizar com as mudanças e consequentemente com as necessidades de adequação e ajustes que elas demandam.

O tempo tem sido um inimigo do homem moderno. Isso é no mínimo contraditório, pois o tempo vem antes do homem. Ou seja, o homem deveria estar no consciente de sua relação com o tempo e discerni-lo como algo de sua própria essencialidade. Ora, quem vive sem o tempo? E uma forma eficaz de lidar com o tempo é conhecendo suas duas faces: kronos e kairós.

Kronos é um tempo cronológico, horário, calendárico, contável, quantificável. É o tipo de tempo que cadencia e organiza nossa vida. É medido pelo relógio. Ao longo da história, tivemos o relógio do sol, o relógio da agua, a ampulheta, o relógio de bolso, o relógio de pêndulo, o relógio de pulso, o atômico e o digital. Dá para perceber por aí a importância e necessidade que o homem atribui ao tempo e seu controle. É nessa tentativa de conter o avanço cronológico do tempo, que o kronos escraviza o homem, e o estresse simboliza essa tentativa inútil de não perder o controle e o poder. Na mitologia grega, Krono é o senhor do tempo e que devora tudo o que é criado. O aprendizado disso tudo é que nada é para sempre.

Já Kairós é o que representa o tempo divino. Na mitologia, possui asas nos pés e nas costas. Surge a qualquer momento. É aquele que muda a rotina. Kairós é o tempo oportuno. Não tem rabo preso. É o momento que sai das conclusões precipitadas de causa e efeito e surpreende a todos com sua soberania, ineditismo, arbitrariedade e esplendor. É viver com a consciência de que certas coisas não podem ser cronometradas, são impalpáveis, eternas e imprevisíveis.

Imagem de StockSnap por Pixabay

Durante a prisão inevitável de kronos, há liberdade quando kairós é percebido. Kronos jamais pode ser vencido, mas quando com ele nos aliamos, podemos estar conscientes do momento presente, quitados com o passado e, sem ansiedade, colocá-lo a serviço de kairós para o nosso futuro. Não ver kairós é perder a oportunidade de fazer o que tem que ser feito na hora certa.

Kairós nos concede a possibilidade de dar um “kronos” para si, para olhar para si por dentro e por fora. Enquanto kronos é medido pelo relógio, kairós é sentido pelas batidas do coração, no ritmo da vida. Entregar-se à kronos é escravidão e à kairós é fantasia, mas quando os colocamos conscientemente ao nosso serviço para o bem da vida, é no momento presente, quando kronos e kairós se cruzam, é que se constrói o melhor dos futuros.

Pense nisso.

Filipe Freitas

Inspirado pela palestra ministrada pelas psicanalistas Ester Alves e Elizabete Ruivo

Author:

Comente

Follow by Email
Facebook
Twitter
YouTube
Instagram