“Vivemos uma onda de psicopatia no país” – Contardo Galligaris
Entrevista com Contardo Calligaris ao Click RBS
Um dos motes do Fronteiras do pensamento neste ano é uma frase que o senhor costuma dizer: “Não quero ser feliz, quero ter uma vida interessante”. O que é uma vida interessante? E seria possível ter as duas coisas?
É possível estar alegre e de bom humor tendo uma vida interessante? Talvez não em todos os momentos, porque uma vida interessante é uma vida que se permite viver intensamente até as coisas dolorosas e desagradáveis. Quando perguntam como eu gostaria de morrer, respondo que fazendo a experiência da minha morte. Gostaria que alguém fizesse comigo os cuidados paliativos, ou seja, me deixasse sem dor, mas perfeitamente acordado para eu me sentir morrendo. Isso é viver de uma maneira interessante, inclusive o momento da morte. Duvido que, a essa altura (na morte), alguém esteja feliz e alegre. Então, não sei se essas duas coisas, a felicidade e uma vida interessante, vão juntas. Ter a felicidade como propósito, do tipo “o que eu quero na vida é ser feliz”, é a garantia de que você vai ter uma vida medíocre. Por uma razão simples. Dito com uma linguagem um pouco elevada, uma vida interessante é uma vida na imanência, não na transcendência. Ou seja, se o que você espera da sua vida é estar na transcendência, seja ela humana ou divina, se você vive na esperança do amanhã, se vive na esperança de ganhar na loteria, na esperança de ser recompensado depois da morte no além ou, ainda, na esperança de que sua vida de adolescente finalmente começará quando passar no vestibular, bom, essa vida não vai ser interessante. A esperança de ser feliz também é uma forma de transcendência. A única vida interessante é a vida que acontece aqui e agora. Não precisa ser épico, não precisa ser extraordinário, não precisa nada. Precisa da presença efetiva de quem está vivendo. O que faz a diferença é estar no momento. O momento pode ser o pãozinho com manteiga e café na padaria da esquina, pode ser escutar um paciente, ler um livro ou ver um seriado na TV. O importante é estar naquilo, e não na espera do que virá depois. A única vida interessante é a vida que acontece aqui e agora. Não precisa ser épico, não precisa ser extraordinário, não precisa nada. Precisa da presença efetiva de quem está vivendo.
Conceitos idealizados, como felicidade ou amor perfeito e cara-metade, acabam nos atrapalhando?
Sem dúvida. Todas as formas de idealização, sobretudo de idealização antecipatória, nos atrapalham. Poucas horas atrás, tive uma sessão com uma paciente que estava com muito medo de estar se apaixonando por alguém porque isso eventualmente não daria certo e terminaria. Eu lhe fiz notar que essa é a estrutura da vida. Como ela está segura de que vai morrer (algum dia), então não deveria perder tempo vivendo? Realmente, a nossa relação com a idealização é dessa ordem. Ela alimenta medos, como o medo de viver alguma coisa que não dure. Não sei de onde veio essa ideia maluca de que a duração seria a garantia de qualquer coisa. Há relações que duram dois dias e são mais importantes e marcantes do que casamentos de 15 anos. É engraçado, porque não são ideias antigas. Quando os clássicos, os romanos e gregos, falam sobre o que nós traduzimos como “felicidade”, aquilo tem um sentido muito diferente do nosso. Estão falando de uma certa sabedoria no uso, na administração de prazeres, afetos, amizades e amores. Não estão idealizando da mesma maneira que nós. Isso começou com a ideia do amor romântico, 200 anos atrás, e vai andando nessa direção.
Às vezes, as pessoas falam coisas como: “Tive um relacionamento de 10 anos, mas não deu certo”. Então, podemos pensar que deu certo durante 10 anos.
Se foi bom durante 10 anos, é um recorde (risos).
O massacre da escola de Suzano chocou os brasileiros. Como se analisa a motivação desse tipo de crime, que estávamos vendo com mais frequência nos EUA?
Mais ou menos, porque no Brasil também acontece. Realengo (o massacre de Realengo, no Rio) existiu. Foi há oito anos. Certamente nos EUA são mais frequentes, até porque os incidentes que realmente chegam ao noticiário internacional são aqueles com pelo menos sete ou oito mortos. Se o cara tenta matar e fere dois, aquilo nem chega aos jornais brasileiros. Mas é frequente nos jornais americanos. Ao mesmo tempo, o Brasil de fato é atravessado por uma onda de – vou medir minhas palavras – psicopatia que é surpreendente mesmo para os padrões americanos. Ela (a psicopatia) não está só nos homens políticos mais em vista do país. Está nas redes sociais, no cotidiano, no crime organizado, mas também no crime desorganizado.
O que é essa onda de psicopatia?
É a possibilidade de desconsiderar completamente a vida do outro. Um dos sinais evidentes de psicopatia é quando alguém, na adolescência, começa a massacrar pequenos animais, domésticos ou não, e a torturá-los com indiferença. O fato de que lhe falte uma dimensão de empatia com um ser vivo, mesmo que seja um inseto, ainda mais se for mamífero, é um péssimo sinal para o futuro. Veja a facilidade com a qual os nossos criminosos são capazes de botar fogo numa roda ao redor da cabeça de um repórter da Globo que subiu o morro, a facilidade com a qual alguém é ameaçado de morte, a facilidade com a qual alguém faz o elogio público do grande chefe da tortura durante a ditadura, a facilidade com que alguém deseja a morte de um oponente político por câncer, por exemplo. São sinais de psicopatia. Ela não está só nos homens políticos mais em vista do país. Está nas redes sociais, no cotidiano, no crime organizado, mas também no crime desorganizado. Pense na facilidade com que eu te mato mesmo se você me entrega o celular que eu pedi – e isso não vai me impedir de dormir. É uma onda de psicopatia realmente especial. Acho que deveríamos levar isso em conta como uma especificidade brasileira. A única coisa, aliás, que me faz ser a favor da reforma da lei do desarmamento é que, se realmente o país for psicopata, e declaradamente as relações nesse país forem psicopatas, eu quero me armar. Porque realmente não tem outra saída.
O senhor é a favor do direito de a população andar armada?
Não. Sou a favor de viver em um lugar onde não tenha arma nenhuma e ninguém mate ninguém. Ou então em um lugar onde tenha uma enorme quantidade de armas, como a Suíça, mas ninguém anda armado, e o número de assassinatos é extremamente modesto. Sou a favor disso. Quero dizer que, se eu vivo em um mundo habitado por psicopatas, que matam e podem desejar a minha morte, e mesmo promovê-la impunemente sem ter nenhuma barreira moral interna ao fazer isso, aí eu quero andar armado, porque senão vou ser morto no primeiro dia.
O que ocorre quando alguém vive na transcendência, ou seja, sempre esperando que sua vida comece no amanhã?
A transcendência pode ser qualquer coisa – Deus, o além, a espera do amanhã, o sol do futuro, a primavera do socialismo. Quando você coloca o foco de sua vida na transcendência, torna-se perigoso para você mesmo e para todos os outros. Essa história que parece tão benigna de “eu só quero ser feliz” na verdade é uma careta inquietante, porque é algo que promete qualquer coisa que farei para que isso se realize. No fundo, é a marca de que somos incapazes de viver em um instante. Como somos incapazes de aproveitar a vida que temos quando ela acontece, nos tornamos perigosos para os outros e para nós mesmos. (A erotização da morte) É a marca do fascismo, porque o fascismo precisou tornar a morte erótica para poder mandar milhões de pessoas para a morte voluntariamente, e conseguiu. Mas essa ideia é tremendamente presente nos jovens.
De que forma?
Um traço importante da psicopatia é a erotização da morte. Quando vivemos a ideia de que o que importa será o amanhã, o que geralmente acontece é que começamos a dar à morte um valor extraordinário, como se fosse um momento no qual eu realmente viverei epicamente a minha vida. Não tem uma música fascista ou nazista que não faça alusão à morte como uma coisa boa ou maravilhosa. E a erotização da morte atravessa todos os últimos 70, 80 ou cem anos, é só fazer uma lista de todos os grupos que se tatuam com caveiras, por exemplo, como se isso fosse a marca de uma especial autenticidade ou glória, como se a morte fosse uma coisa que nos desse dignidade. Isso não passou. É a marca do fascismo, porque o fascismo precisou tornar a morte erótica para poder mandar milhões de pessoas para a morte voluntariamente, e conseguiu. Mas essa ideia é tremendamente presente nos jovens. É um plano homicida, mas também suicida. Do tipo: “Não vou conseguir ser nada do que gostaria. Não vou ser um herói de um game de tiro; não vou me parecer com nenhuma das personagens de novela ou seriado que vejo, mas vou encarnar a morte para os outros e eu mesmo vou go down in flames (“arder em chamas”)”. Essa erótica da morte, que aparece na caveira na cara de um dos atiradores (de Suzano, que postou uma foto com uma máscara de caveira), deve ser considerada importante.
Essa questão tem a ver com o tema da sua conferência no Fronteiras do Pensamento em outubro?
Não vou antecipar muito, mas vou usar essa fala para ter um discurso polêmico para mostrar que não vale a pena a gente acusar a idealização da propaganda, a idealização pela nossa ficção ou a idealização romântica do amor. Tudo isso é verdade, mas a doença, essa doença cujos fenômenos nós vemos se multiplicando agora, está na raiz da nossa cultura.
Da cultura brasileira?
Não. Da nossa cultura ocidental. A psicopatia brasileira é uma consequência. É certamente mais brasileira do que europeia, e existe também nos EUA. Mas os americanos encontraram uma solução. Poderiam ser um país totalmente psicopata, só que acabaram dando uma dignidade e uma força de presença ao braço armado da lei que impõe condições quase morais de existência. A polícia nos EUA não se confunde mais com o crime. Já aconteceu no passado, mas não se confunde mais. Se você está no Rio de Janeiro, vai ver que se confunde. Está difícil distinguir as duas coisas. Se eu tivesse que falar de doença do século 21, estaria em algum lugar entre a perversão e a psicopatia.
Dizem que a histeria foi a doença do século 19, e a depressão, a do século 20. Caso o senhor concorde com essa premissa, qual é a doença do século 21?
Concordo em parte com a premissa. Não concordo muito com a ideia de que a depressão foi a grande doença do século 20. Tornou-se a grande doença do século 20 porque, a partir do fim do século, em 1990, os antidepressivos fizeram uma grana federal. Então, era necessário que houvesse muitos deprimidos para que aquilo tivesse função. Os laboratórios ficaram muito felizes. Mas se eu tivesse que falar de doença do século 21, estaria em algum lugar entre a perversão e a psicopatia.
Sobre a psicopatia o senhor já comentou. Por que a perversão?
A perversão, do meu ponto de vista, não tem nada a ver com o que chamamos genérica e impropriamente de perversões sexuais. A perversão é uma doença de grupo. Opera quando você desiste dos seus anseios, freios e limites individuais e passa a fazer parte de um grupo para o qual você delega todas as suas preocupações morais. Então, ninguém é perverso, as pessoas se tornam perversas no grupo. Se você lembra ou leu sobre o incêndio do índio Galdino, em Brasília, há mais de 20 anos (em 1997, quando o índio Galdino Jesus dos Santos morreu queimado por cinco jovens), nenhum daqueles guris individualmente teria feito uma cagada dessas. Agora, foi suficiente que fossem cinco para poder fazer isso e achar divertidíssimo. Essa é a perversão. A perversão não é tanto o fato de colocar fogo em um índio, é o fato de entrar em um grupo, mesmo que seja temporário ou de cinco pessoas… Pouco importa que sejam cinco amigos ou o Partido Nacional-Socialista, não faz diferença. É entrar em um grupo que te permita esquecer os freios morais básicos. (A perversão) Opera quando você desiste dos seus anseios, freios e limites individuais e passa a fazer parte de um grupo para o qual você delega todas as suas preocupações morais.
Há um velho chavão de que os jovens são o futuro do Brasil. Talvez tenha a ver com aquela ideia de transcendência que o senhor criticou. qual é a probabilidade de os jovens transformarem alguma coisa no futuro?
Faz 15 anos que atendo só no Brasil, então não teria sentido comparar com os jovens americanos e ainda menos com os europeus. Mas continuo com a mesma crítica. Vejo os jovens de hoje desejando pequeno. A mãe de um dos dois atiradores de Suzano, que é uma mulher pobre e provavelmente se sacrificou para que o filho tivesse o que queria, disse: “Não entendo. Ele tinha tudo que queria”. (A declaração literal foi: “Ele tinha internet, TV a cabo, tinha tudo. E o bobão faz isso?”.) Achei essa frase tão tocante porque poderia ser dita em condições análogas por muitas mães. É como se a gente estivesse sempre no primeiro ano de vida: quando o bebê chora, seja porque não está gostando do sol ou porque o barulho é muito alto, a única coisa que lhe é dada em resposta é comida. Mas é engraçado como esse modelo de alguma forma continua na relação entre pais e filhos. Como somos todos, e não só essa mulher, relativamente surdos ao que as crianças pedem e sempre lhe devolvemos algo que no fundo nunca é tudo o que eles queriam, e às vezes não tem nada a ver com o que queriam. Respondendo à pergunta: não sou otimista sobre o futuro do Brasil, pelo menos não a partir dos jovens que eu vejo em geral. Acho que eles são mal-educados, e não no sentido de não saberem usar a faca na mão direita, isso seria o de menos, mas no sentido de que não aprendem o suficiente na escola. Acho que têm pouco gosto pelo esforço de se formar, crescer e trabalhar. Não sou otimista.
Seria porque os jovens, pelo menos os de classe média, têm uma situação muito mais confortável do que tiveram seus pais? Os pais sabem como é difícil construir uma vida e querem poupar os filhos disso tudo?
Sim. Grande parte das classes médias começou a querer facilitar a vida dos filhos além da conta. Os pais da classe média paulistana, e suponho que não seja diferente de Porto Alegre, ficam horrorizados se o professor supõe que os alunos estudem em casa duas ou três horas por dia. São capazes de telefonar para a escola indignados porque as crianças vão cansar. Não vão poder sair para a rua e se divertir? Eles têm uma relação doentia quando o esforço aparece primeiro. Os pais não querem que os filhos se esforcem. Agora, claro, há algumas exceções. Os pais não querem que os filhos se esforcem. Agora, claro, há algumas exceções.
A falta de ambição dos jovens seria, nesse caso, reflexo da falta de ambição dos pais?
Sim, claro.
Boa parte da sociedade brasileira está endividada e trabalha contra a máquina. Tirando a parte mais pobre da população, que tem pouca margem, esse problema de poupança do brasileiro teria a ver com a dificuldade em adiar o prazer, ou seja, a necessidade de consumir bens imediatamente e não economizar?
Sem dúvida tem isso, mas essa não é só uma questão brasileira. A especificidade do Brasil é que se trata de um lugar onde não há crédito – há usura. É diferente. Nossos amigos banqueiros vão tentar me convencer de todas as maneiras possíveis do contrário, mas não existe um nível de inadimplência que justifique esse juro ao consumo ou ao crédito pessoal no Brasil. Faça uma experiência. Coloque, sei lá, R$ 50 mil de investimento em um fundo do seu banco. Daí, pergunte ao banco se pode dar esse fundo na garantia de um empréstimo do mesmo valor. Você não vai poder tocar nesse dinheiro, que é seu, mas fica nas mãos do banco, até você ter pago o empréstimo. Essa operação, em qualquer lugar do mundo, tem um juro ridículo, porque a garantia é absoluta. No Brasil, não. Tem um juro abusivo. Então, o problema no Brasil é que as pessoas que consomem dessa maneira são vítimas de um assalto.
A vigilância e o julgamento que vemos nas redes sociais se refletem em angústias no consultório?
Um pouco, mas menos do que eu imaginaria, e talvez menos do que alguns anos atrás. Ouço muito menos os meus pacientes falarem do Facebook deles do que alguns anos atrás. Claro que foi um tempo extraordinário que ainda pode ser analisado como o momento em que todo mundo criou um ou vários avatares, e isso se tornou um tremendo trabalho da imaginação de cada um. Digo avatar no sentido de ser aquela figura que você quer mostrar aos outros. Aquilo teve um efeito tremendo sobre a vida de cada um. Ainda lembro de crianças nos anos 1980 ou 1990, no começo dos jogos de RPG. Quando o avatar de um menino morria em um RPG, aquilo era considerado quase um risco de suicídio do ponto de vista clínico. Era importante ficar de olho no menino, recomendação da própria American Psychological Association. Mas acho que esse tempo passou. Estou vendo um efeito, por outro lado, interessantíssimo, extremamente positivo das redes sociais. Um número de pacientes, sobretudo mulheres, hoje acessam diariamente o Tinder e têm encontros amorosos que podem se transformar em outra coisa, temporária ou não, graças aos aplicativos de paquera. Isso acho altamente positivo. Pense em uma mulher separada há sete anos, sozinha, sem conhecer ninguém, à mercê das amigas que quem sabe lhe apresentarão um amigo do marido, que geralmente é alguém que sobrou no mundo. Ela pode entrar em um aplicativo, sair hoje à noite e transar. Não necessariamente vai ser a transa do século, e às vezes até é. Isso eu acho que foi uma melhora significativa. É possível que um dia a psicanálise mude de nome, mude também alguns dos fortes teóricos nos quais se baseia. Agora, o dispositivo acho que vai durar.
Fazendo uma provocação: a psicanálise ainda é relevante hoje porque é uma boa visão de mundo ou porque é uma boa ciência?
(Risos.) Acho que é um bom dispositivo. Não é nem uma visão de mundo, nem propriamente uma ciência. É um bom dispositivo, que tem mais ou menos 3 mil anos. Esse dispositivo da cultura ocidental, que provavelmente acontece também em culturas orientais, é que precisamos de alguém que não seja nem um amigo, nem um parente, para quem possamos falar de nós na esperança de que esse alguém nos diga algo no que nós dissemos que nós mesmos não escutamos. Esse dispositivo tem 3 mil anos. Passou por uma série de figuras que vão desde o confessor até o conselheiro espiritual, até o “amigo” do bar – amigo entre aspas, porque justamente é melhor que não seja um amigo. É possível que um dia a psicanálise mude de nome, mude também alguns dos fortes teóricos nos quais se baseia. Agora, o dispositivo acho que vai durar.
Como o senhor analisa a psique do presidente Jair Bolsonaro?
(Risos.) Adoraria se ele viesse me ver, talvez eu pudesse analisá-lo. Nesse caso, infelizmente, não diria absolutamente nada para você… Não tenho elementos para me aventurar a fazer isso. Ele realmente me desconcerta. A única coisa em que às vezes eu penso é que sua vitória foi para ele mesmo inesperada. O que acho mais surpreendente, mas também deve ser um campo de enorme dificuldade para ele, é a relação com esses três filhos, que me assustam um pouco. Me assustam sobretudo porque normalmente acho que a família não foi criada para ser um lugar em que todos concordam com todos. Ao contrário, a família, como cada um sabe, foi inventada para ser um lugar em que todo mundo discorda. Por isso, ela eventualmente é interessante e educativa. Quando vejo essa família, não são todos, mas pelo menos os três irmãos parecem uma espécie de coalizão partidária ao redor do pai. Isso me assusta. Mas não vou me aventurar a analisá-lo.
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Contardo Calligaris
Colunista da Folha de S.Paulo, o psicanalista e escritor italiano radicado no Brasil tem sido uma expressiva voz intelectual em diferentes temas, seja por meio de seus livros (como Cartas a um Jovem Terapeuta), seja por artigos e entrevistas na imprensa.